Wagner Sarmento
Da TV Globo Nordeste
Da TV Globo Nordeste
Ryan é, ao
primeiro olhar, uma criança como qualquer outra. Corre, brinca, dança.
Sorri, gesticula, balbucia. Mas tem um detalhe que o diferencia: quando
dorme, Ryan para de respirar. É portador da Síndrome de Ondine, um
distúrbio raro, que afeta uma em cada 200 mil crianças nascidas. A
doença aprisiona. Ryan tem 2 anos e oito meses e nunca saiu do hospital.
Vive preso à necessidade de ventilação mecânica todas as noites. Mas a
libertação existe. O garoto precisa de um marcapasso diafragmático, que o
permitiria, enfim, ir para casa. O aparelho, no entanto, custa R$ 450
mil. A família não tem recursos e critica a inércia do Estado. E busca
na Justiça o direito de ver Ryan crescer fora da UTI. A história de Ryan
foi contada no NETV 1ª Edição desta quinta-feira (4) (veja vídeo ao
lado).
O menino nasceu em Custódia, no Sertão de Pernambuco, a 335 km do Recife,
e foi direto para a UTI. No segundo dia de vida, seguiu para o Hospital
Maternidade Jesus Nazareno, em Caruaru, no Agreste, a 140 km, onde
continuou entubado. Até então, não se sabia qual era o problema do bebê.
Diante da complexidade do caso, Ryan foi transferido para o Hospital
Barão de Lucena, na capital, onde permanece até hoje. Apenas aos cinco
meses de vida, um exame de DNA revelou a síndrome que acomete a criança.
O mundo de Ryan
é o terceiro andar do hospital. Ele dorme e passa a maior parte do
tempo no berço da UTI neonatal. Quando sai da sala intensiva, tem poucas
opções: um corredor estreito, entre equipamentos médicos e
funcionários, e uma brinquedoteca, refúgio onde consegue, ao menos por
alguns minutos, interagir com outras crianças. Os colegas recebem alta
depois de alguns dias, uma semana, um mês. Menos Ryan. O pequeno nunca
conheceu o município de Arcoverde, no Sertão, terra de toda a sua
família.
O mundo de Ryan
é Carolynne de Brito, 18 anos, adolescente que a vida forjou adulta.
Carol, como gosta de ser chamada, engravidou quando tinha 15 anos. O pai
da criança manda dinheiro, mas nunca visita o filho. Cabe à mãe a
missão de cuidar do rebento e lutar para vê-lo sair dali. Carol também
mora no Hospital Barão de Lucena. Parou de estudar, não trabalha e dorme
num alojamento destinado a familiares de pacientes. "A minha vida é
bastante difícil, porque eu tive ele aos 16 anos. Era adolescente e de
repente tive que amadurecer pra encarar toda essa realidade e essa
responsabilidade", conta ela.
Desde o início
do ano, os advogados Erasto Tenório e Gabriela Vilela assumiram a defesa
de Ryan. Há dois meses, eles entraram com uma ação na Justiça para
obrigar o Estado a custear a cirurgia no menino. Cobraram urgência. Uma
semana depois, o juiz Marcone Nascimento, da 6ª Vara da Fazenda,
determinou que o governo estadual adquirisse o marcapasso diafragmático e
bancasse a operação. No mês passado, o Estado recorreu.
Pioneiro no
Brasil neste tipo de procedimento, o cirurgião torácico Rodrigo
Sardenberg, de São Paulo, já esteve em Pernambuco para examinar Ryan e
explicou que aguarda apenas uma negociação com o governo local para
viajar ao Recife e colocar o marcapasso diafragmático em Ryan. O
aparelho existe no mercado há quatro décadas, foi liberado pela Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em 2009 e implantado num
paciente brasileiro pela primeira vez em 2010.
O alto preço do
equipamento, segundo Rodrigo, não é argumento. Um paciente de UTI
custa, aos cofres do Estado, entre R$ 1 mil e R$ 2 mil por dia. Num
cálculo mínimo, o governo já gastou cerca de R$ 1 milhão com Ryan - ou
seja, pelo menos o dobro do valor do marcapasso, que é de R$ 450 mil.
Enquanto a
situação não se define, Ryan continua na unidade de saúde, exposto ao
risco diário de contrair uma infecção hospitalar. "O marcapasso
diafragmático tira o paciente da dependência da traqueostomia e da
ventilação mecânica e o coloca próximo de uma situação mais próxima da
fisiológica. Isso melhora muito a qualidade de vida. Viver numa UTI
atrapalha muito o desenvolvimento da criança. Além do perigo de uma
infecção, ele fica sem poder ir à escola, sem o ambiente familiar, sem
integração social", afirma o médico.
Em nota, a
Secretaria Estadual de Saúde (SES) disse que Ryan "é acompanhado, desde
os primeiros dias de vida, no Hospital Barão de Lucena, onde conta com o
apoio de uma equipe multidisciplinar, que não tem medidos esforços para
oferecer a melhor assistência ao menino". A SES informou que a criança
recebeu, no mês passado, um suporte ventilatório para poder deixar a
UTI. Segundo a pasta, o paciente está em processo de adaptação ao
equipamento. Em relação à cirurgia necessária para Ryan sair do hospital
e poder ir para casa, a SES afirmou que a compra do marcapasso foge dos
padrões habituais de aquisição da secretaria, pelo alto custo e que
precisa ser importado dos Estados Unidos, mas o processo de compra do
marcapasso diafragmático "já está na fase final de licitação".
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